The Somnambulist
The Somnambulist
de Jonathan Barnes
“Esteja alertado. Este livro não possui valor literário algum. É um pálido pedaço sem sentido, enrolado, implausível, povoado por personagens pouco convincentes, escrito em uma prosa medonha e pedestre, frequentemente ridícula e patéticamente bizarra. Não preciso dizer que, eu duvido que você venha a acreditar em uma palavra dele”
Este alerta é o início da novela de estréia de Jonathan Barnes. Tanto um tributo as raízes da tradição pulp, onde se pede a indulgência do leitor ao apresentar eventos fantásticos, quanto um gancho intrigante para ocorrências improváveis que possam vir a ser narradas. Em adição, a abertura de O Sonambulista estabelece que estamos lidando com um “narrador não-confiável”, de fato, o próprio narrador atesta que mentirá ao leitor mais de uma vez durante a história “ Em que, então, devem acreditar? Como irão distinguir a verdade da ficção?”
“Naturalmente eu deixo para o seu discernimento”.
Rainha Victoria morreu “alguns meses atrás” quando a história se inicia, então nos situamos no ano de 1901, um momento pivô do novo século. Velhos modos estão desaparecendo, e novas tendências e movimentos estão acelerando. Por isso é fácil imaginar que um não-mais-tão-jovem mágico de palco vitoriano chamado Edward Moon se sinta como uma relíquia. Seus números [repletos de magia real, aliás] não mais atraem vastas multidões como já fizeram um dia, e até mesmo sua outra ocupação resolvendo crimes insolúveis perdeu seu brilho, sua reputação foi arruinada por um ultimo caso mal-sucedido. Todos os malfeitores que representam um desafio estão presos.
Não, esse novo século não é hospitaleiro a um indivíduo da natureza de Moon, nem de seu parceiro, o Sonambulista, um homem imenso e careca sem nenhum outro nome, completamente silencioso e invulnerável, que se comunica por palavras[mal] escritas em uma pequena lousa… e que se alimenta apenas de leite. Leal, misterioso, e lento de raciocínio ele é indispensável para Moon, tanto quanto seu vício em prostitutas com deformidades físicas.
Moon já viu tempos melhores; seu auge já passou, seus cabelos estão rareando e suas roupas estão fora de moda. Ele pertence a um tempo anterior, uma Londres mais velha onde existiam grandes casos e crimes para ocupar sua mente e o teatro estava cheia todas as noites quando ele apresentava suas ilusões com o Sonambulista. Esses tempos se foram. Um novo século começou e parece que Edward Moon irá desaparecer no passado.
Mas quando os cadáveres de ricos começam a surgir, e o detetive Merryweather pede a ajuda de Moon. O mágico sente um caso digno de suas habilidades, então, desesperado e entediado, Moon se agarra a chance de provar que ainda pode agir, e junto com o Sonambulista toma parte na investigação. Mas como qualquer outra novela de mistério The Somnambulist é um distorcido e sinuoso conto que te indica várias direções ao mesmo tempo. E enquanto a resposta no final é uma constante, a questão durante o livro muda. Os assassinatos são só a ponta de um iceberg, e Moon logo está tentando desmascarar uma conspiração para um ramo secreto do governo, uma conspiração que poderia destruir a cidade.
Os personagens são únicos e maravilhosos, assim como doentes e depravados, surgindo da névoa Londrina como espectros: Uma dupla mortal, alegres mensageiros da morte e destruição, os Prefects, e a partir do momento em que eles atravessam um coração com um guarda-chuva e então o abrem você tem certeza que estes dois homens, um grande e um pequeno, sempre vestidos em uniforme escolar, são parte de um muito imaginativo e deturpado elenco. Elenco que inclui personagens como Mr. Cribb, que clama ser tão velho quanto a cidade e que viaja no tempo de sua vida de trás para frente; Ned Love, que conheceu o poeta Coleridge; Madame Innocenti, uma médium que pode realmente contactar os mortos; Mina a prostituta barbada; um ambulante que carrega um cartaz onde se lê: “Certamente Eu Logo Chegarei. Revelações 22:20” e um albino com um problema relacionado a arsênico.
Barnes emprega o artifício de um esperto, mas não-confiável, narrador que pode passar a narrativa por níveis frenéticos. Novos personagens são introduzidos quase a cada três páginas, assim como novas reviravoltas no enredo. A conspiração suprema tem certamente uma qualidade lunática digna de Chesterton.
Nos capítulos finais o narrador invisível é revelado e a história que até aquele ponto era um mistério policial de época com elementos fantásticos se torna uma fantasia completa, tendo se construído de uma maneira que quando a mudança ocorre faz completo sentido, e você não pode imaginar a história como tomando outra direção a não ser uma inundação surrealista.
Na fina linha entre o humor e a paródia, a obra de Barnes está sempre se equilibrando na beirada.
Uma história de alguém que ao resolver um mistério, quer resolver a si mesmo. Moon é um homem que é assombrado por casos mal sucedidos, e amizades mal-sucedidas do passado, preso a uma carreira decadente como mágico. Ele não precisa resolver o mistério porque é a coisa certa a se fazer, ele precisa desvendá-lo porque é o único gesto que pode reconectá-lo com a pessoa que ele pensa que deve ser. Moon é um personagem moderno preso em um mundo Vitoriano por assim dizer.
Por Karl
“A foggy day, in London town
It had me low, and it had me down”